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1 de janeiro de 2014

UM AUTÊNTICO ALIENÍGENA

Illustrations from the Nuremberg Chronicle, by Hartmann Schedel (1440-1514)
Um autêntico alienígena. É assim que me sinto em momentos como este - réveillon de 2013 para 2014.

Com a existência do Facebook fica mais fácil experimentar esta sensação. Vejo todos compartilhando fotos e comentários sobre como estão curtindo o momento, festejando com amigos e familiares na praia ou em suas casas ou em shows da virada, queimando fogos de artifício, comendo, bebendo e conversando. E eu aqui, em casa, escrevendo isso, jogando, conversando com minha esposa, ouvindo música, ou seja, passando este período tentando ao máximo possível ignorar o que meu preconceito classifica como reação exagerada de felicidade incondicional, mas que na verdade é apenas a expressão da liberdade individual que cada um tem em comemorar um acontecimento como lhe convêm dentro dos limites legais - e se todos aceitam uma convenção social que lhes diz para usar roupas brancas, queimar fogos de artifício e se comportar de uma certa forma, não tenho o direito de julgar, mas me reservo a opção de não adotar a conduta convencional - não para ser intransigente, mas sim por não gostar desta.

Voltando ao Facebook, vejo postagens das pessoas se vestindo e maquiando super bem, se produzindo, tirando fotos para mostrar como estão felizes, como tem vidas divertidas, como são bacanas e como a depressão, estresse, miséria psicológica, intriga, maldade, pressão, medo, abandono e tudo o mais podem ser esquecidos por uns instantes. E eu aqui, de pijamas, tentando acalmar meu cachorro que está todo aflito com os barulhos dos rojões, e fazendo questão de viver este momento exatamente como vivo todos os demais.

Sei que momentos como este são importantes do ponto de vista psicológico e emocional. Ciclos são importantes e a comemoração destes (para a maioria das pessoas) é algo muito importante. Não acho nada disso errado. Eu mesmo devia estar na igreja - íamos passar o ano novo lá em uma reunião de oração e comunhão com outros membros e que deve ter sido maravilhosa, mas não fomos por receio das ruas, repletas de pessoas bêbadas guiando carros e porque não bandidos a espreita de pessoas desavisadas indo e vindo de comemorações, totalmente distraídas. Ficamos em casa, como sempre temos ficado há anos. Esperamos os fogos passarem, e então vamos dormir. Este anos fizemos um brinde com Calpis.

Eu sei que sou recluso, e esse tipo de comportamento se repete nas demais festividades coletivas, ou mesmo nas particulares que são comuns a todos (aniversários por exemplo). Eu ão tenho a necessidade de comemorar estas coisas com a mesma importância e intensidade que o coletivo parece precisar - ou desejar. Não vejo motivos para comemorar entusiasticamente uma passagem de ano além de fazer uma simples reflexão do que passou no ano, aprender com os erros e acertos, ser grato a Deus por tudo e no máximo pensar em algumas coisas que gostaria de fazer no ano seguinte, pedindo a orientação de Deus sobre isso e sua benção de acordo com sua vontade.

Na verdade já estou acostumado a ser "estranho" neste sentido - e muitas vezes me sentir estranho por mim mesmo, sem um julgamento ou sensação de julgamento de uma outra pessoa. Ou seja, eu mesmo me acho estranho por não ser como os demais.

Por exemplo: a própria comemoração do Natal já me incomoda há bastante tempo e eu não compartilho do senso comum quanto a como ela deve ser experimentada. O mesmo diz respeito a maioria do modo operante em quase todas as coisas. Eu tenho opiniões próprias quanto a muitas coisas, mas que vão contra o senso comum.

Isso me causava, na infância e adolescência, uma sensação de deslocamento imenso. Isso evoluiu para revolta por muitos anos, e creio que meus familiares se lembram dessa época com medo pois eu era bem revoltado. Depois isso evoluiu para indiferença, e hoje, para o que acho ser o início de uma compreensão mais equilibrada: sou um ser humano como outro qualquer, mas que está fadado a viver com o constrangimento de ser sempre visto como diferente porque de fato eu sou.

Assim, consigo imaginar um pouco como um alienígena se sentiria disfarçado entre nós.

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